Include

"Incluir" é uma dessas palavras que entrega o ouro ao bandido, ou seja, revela para o seu leitor que o texto é uma tradução do inglês.
É claro que o verbo existe, é claro que é muito utilizado e tem razão de ser; aqui o problema é outro - é o fato dele ser usado como "coringa", "sujando" a canastra.
Como já comentei em outra postagem aqui no blogue, a maioria dos textos médicos é redigida por profissionais da escrita ou profissionais de saúde de outras áreas, não da medicina; muitas vezes, por exemplo, diante da enumeração dos sinais e sintomas de uma doença, eles não têm certeza se são só aqueles itens ou não e lançam mão de include, que pode não estar propriamente certo, mas com certeza não estará errado.
Até aí tudo bem, faz parte do jogo.
O problema é quando todas as enumerações são precedidas de include, o verbo ser cai no ostracismo e você tem pelo menos três a quatro include por parágrafo.
Mesmo quando o tradutor ou o medical writer não tem certeza se o verbo adequado seria "ser" ou "incluir", o idioma coloca à sua disposição inúmeras alternativas:
- "Entre os principais sintomas temos..."
- "Os sintomais mais comuns são..."
- "Os sintomas costumam ser..."
Além, evidentemente, da sinalização para o copyeditor/revisor/editor/program manager/terminologista/linguista/revisor técnico ou qualquer função exercida por alguém com mais experiência no assunto.
O patético é que, ao querer usar o verbo incluir na sua acepção original o autor e o tradutor são obrigado à tautologia "inclui, mas não se limita a (...)", que é a própria definição do verbo em questão.
Exemplo prático:
"Cold symptoms include runny or stuffy nose, sore throat, cough, congestion, slight body, low-grade fever, aches or a mild headache."
Tradução:
"Os sinais* e sintomas do resfriado são secreção ou congestão nasal, faringite, tosse, discreta mialgia, febre baixa ou leve cefaleia".
São.
Simplesmente são.
Esses são os sinais e sintomas do resfriado, o que não quer dizer que o paciente precise apresentar todos ao mesmo tempo, nem quer dizer que não possa apresentar outros extemporâneos (como a diarreia, por exemplo). Mas são, não incluem.
Se aparecer algum outro sinal ou sintoma já não é só resfriado, pode ser gripe ou algo mais.
Tradução alternativa:
"Os principais sinais e sintomas do resfriado são secreção ou congestão nasal, faringite, tosse, discreta mialgia ou leve cefaleia".
ou ainda
"Os sinais e sintomas mais comuns do resfriado são secreção ou congestão nasal, faringite, tosse, discreta mialgia ou leve cefaleia".
Ao terminar o seu texto conte quantas vezes o verbo incluir aparece e veja quais as situações nas quais ele está lá somente de coringa, podendo ser substituído com vantagem por outros termos mais utilizados na linguagem corrente.
O número de ocorrências do verbo "incluir" em um texto médico é inversamente proporcional à qualidade do texto. Pode acreditar.
*Secreção nasal, faringite e tosse são sinais; mialgia e cefaleia são sintomas. A congestão pode ser sinal ou sintoma, dependendo do grau.